Uma pirueta, por favor

  Desde cedo a menina queria ser bailarina. Dançar. Voar. Encantar. Alongar. Pular. Bailar. Chorar. Emocionar. Foi a várias aulas experimentais e nunca continuava. Ou porque sentia que não se encaixava ali, ou por causa da falta de apoio.
  Por volta dos 8 anos, em uma aula qualquer do fundamental, a professora de educação física (que também era professora de ballet), pediu licença à outra professora para falar com as alunas e as perguntou quem gostaria de fazer aulas de ballet. Esse parecia o momento que tanto a menina esperava e não demorou para levantar a mão e dizer que queria. Porém, a professora, com cara de desgosto a disse que não poderia fazer ballet por ser "gordinha". Sim, a professora disse isso. E sim, foi na frente de toda a sala. Isso foi o suficiente para toda a turma cair na gargalha. Como já era tímida, a menina ficou vermelha, azul, roxa... Chegou em casa chorando e com a insistência dos pais, os contou o que havia acontecido. Ligaram para a diretora da escola e pediram uma satisfação. Na manhã seguinte a menina foi chamada na sala da diretora e ouviu que realmente, talvez não fosse muito a "sua praia" o ballet. Deveria tentar o jazz.
  Com isso se matriculou em uma escolinha de jazz e dançou por uns 5 meses. Fez até uma apresentação. Estava realmente gostando. Até que precisou mudar de bairro, deixando a dança para trás. Não totalmente, claro. Pois em sua mente continuava a sonhar em um dia conseguir realmente ser uma bailarina. Ou quem sabe, apenas fazer uns pliés. Mas como iria dançar sendo "gordinha" daquele jeito? Não, sinceramente não tinha como. Ela não foi feita para aquilo.
   Há alguns meses atrás, decidida de realizar um sonho, a tal menina com agora seus 15 anos de idade, decidiu fazer uma aula experimental e ver no que dava. Isso depois de emagrecer uns 10 quilos, claro. Cheia de vergonha, ligava para os studios de dança e perguntava se tinha aula para adultos iniciantes. Entre vários "sim", escolheu o studio em que a dona fora a mais simpática. Colocou uma roupa confortável e foi em busca da alegria. Da sua alegria! A menina amou... E olha só, recebeu vários elogios da professora. Matrícula feita, era a hora de começar. Fez questão de trabalhar para conseguir pagar as mensalidades. Assim, não seria questionada. De mês em mês, conseguia ver claramente sua evolução. E era só entrar naquela sala com o piso brilhante que o seu sorriso ficava mais brilhante ainda.
  Agora está ensaiando diariamente para o festival de final de ano. Roupas compradas, depois de trabalhar duro para dar conta. Coreografia gravada. Frio na barriga. O medo de errar algum passo. As costas que não param de doer. Os pés com bolhas. A pequena decepção quando não consegue executar um passo corretamente. A luta dolorida para melhores alongamentos e aberturas. Porém nada e nem ninguém pode tirar a felicidade que toma conta dela, quando faz seu coque e coloca suas sapatilhas.